O ângulo morto é a área circundante ao automóvel em que o condutor, apesar de sentado numa posição adequada, não o consegue visualizar.
Com os meus 30 anos de experiência em ambiente corporativo e sendo especialista em alavancagem orgânica, desenvolvimento sustentável e saudável de empresas, em diversos Países, sempre me preocuparam os “ângulos mortos da gestão”.
O tema torna-se ainda mais relevante com o desenhar dos planos de saída das crises, por se tornar mais intensa a tentação de recuperar em poucos meses o que resultou de uma construção plurianual e multifatorial.
Proponho que reflitamos sobre dois, mas existem, como sabemos muitos mais:
1. É tão importante o what como o how. A ambição desproporcionada de um resultado de curtíssimo prazo sem a construção da base certa para o obter, no prazo pretendido, pode frequentemente degenerar em comportamentos errados, ou seja, o gestor menos experiente pode desprezar os princípios fundamentais da ética e da compliance. Quando isto ocorre é também uma óbvia falha de Governance.
2. Aversão às perdas – O conceito de aversão às perdas é certamente o contributo mais significativo da psicologia para a economia comportamental. Líder que não entende este conceito terá dificuldade em trabalhar a retenção dos seus mais preciosos colaboradores. De acordo com vários investigadores da área (D.Kahneman, J. Gottman), para o cérebro humano, o negativo suplanta o positivo e a aversão à perda é uma das manifestações de um grande domínio da negatividade. A informação má é processada mais facilmente do que a boa. A longo prazo uma boa relação depende mais de evitar o negativo do que procurar o positivo. Para os gestores, este conhecimento é essencial quer em práticas de recursos humanos (em remunerações: as pessoas que perdem sofrem mais do que as pessoas que deixam meramente de ganhar, má comunicação interna, etc), mas também é uma característica omnipresente nas negociações.
Para além da sua importância isolada e tratando-se de fenómenos que podem surgir como independentes, rapidamente começam a desenvolver uma correlação positiva.
Notemos que foi já em 2004 que uma marca introduziu nos seus automóveis o BLIS – Blind Spot Information System, um sistema eletrónico de deteção e aviso de veículos no ângulo morto de visibilidade.
Compete ao gestor responsável garantir que nunca conduz sem o seu BLIS.
Carla Rebelo, Diretora Geral Adecco Portugal
In Jornal Expresso, 3 de Outubro de 2020